sexta-feira, 11 de maio de 2012

Domínio Sobre O Tempo

Saberá que irá conseguir!

Afinal, o oculto se utilizará das mais puras leis da física. Depois de alguns anos, ou quem sabe... dias, todos farão a façanha com facilidade, é provavel que se torne até brincadeira de criança. Criança, jovens, adultos, o mais velho velho, todos, talvez apenas à excessão dos pobres, terão com facilidade o domínio sobre o tempo.

Tornarse-á, obviamente, muito mais conhecido que Einstein. Ficará em terceiro lugar na lista de celebridades, perderá em fama somente para The Beatles e Jesus. E=mc2? Será piada! Porquê números e fórmulas, pra quê tantas contas?

Terá a idéia da teoria em um cinema, enquanto pela segunda vez assistirá um filme monótono do qual Aninha gostará, lembrará, e até graça achará. Dará mais atenção ao decote que Aninha usará que ao filme, este será o momento quando descobrirá esta quinta dimensão do universo: A distância mental! Não se concentrará nas cenas, e terá a impressão de uma sessão mais curta, pois a verá mais "de longe".
Após algum tempo correrá risco de morte, e notará como alguns segundos parecerão uma pequena eternidade. Então descobrirá o futuro óbvio: O tempo será sempre a mais intrigante dissonância harmônica da natureza. E que por isso, o tempo, ao contrário dos corpos da matéria que são constituídos de átomos e têm massa, diminue à medida em que um observador "se aproxima" dele.

Então usando toda a sua lógica se esforçará dia e noite, em um trabalho disciplinado e com afinco, dia e noite sem parar, até que conseguirá, através da total concentração, chegar ao zero-absoluto das horas, paralisará o mundo ao seu redor, realizando o antigo sonho da humanidade de ter domínio sobre o tempo.

No início será dificil apoderar-se da elevada concentração que lhe aproximará do tempo, no entanto, criará um método, ficará duas horas diariamente na estação ferroviária e observará cada vez mais atentamente o ritual da saída e chegada dos trens. Os dois primeiros dias serão quase totais fracassos, nada se compreenderá, ainda pouco do futuro será subjuntivo. No terceiro dia as duas horas serão um puco mais longas, e isso lhe dará forças. Minha alma começará a aparecer. Ao final do décimo oitavo dia perceberá que as mesmas, já familiares duas horas, demorarão seis horas para se cumprirem. No triségimo dia conseguirá um milagre: Notará que estarei mais perto, que as duas horas equivalem vinte e quatro, e que poderei sentir o cheiro do tempo.

Então já terei a comprovação da aplicação da teoria, mas decidirei não contar a ninguém. Almejarei ir mais longe, afinal, tempo não será problema. De tanto entusiasmo com a descoberta abandonarei o emprego e passarei na estação dezessete horas diárias, já que equivalerão a quatro semanas. Saberei-me cada vez mais concentrado naquelas cenas cotidianas, calcularei e contarei cada milimétrico acontecimento, reunirei em minha mente todos os efêmeros sons incidentais.

Após seis meses do início da experiência, começarei a pensar apenas no tempo, como fora dele, dia e noite, não mais dormirei. O contato com as outras pessoas será impossível, todas serão aos meus olhos como meros personagens de um filme em câmera lenta, e suas vozes, apenas um grave e longo murmúrio sem sentido. Após um ano de treinamento mental, sentirei-me, mais que nunca, próximo ao tempo. Agora ele me parece já presente. Não sou mais escravo do tempo, sou seu discípulo, seu amigo, seu mestre. Sei que estou quase no zero-absoluto e faço planos sobre o tempo parar.

As pessoas não mais me vêm, seus sentidos, devido à minha relativa velocidade, não podem captar minha presença. Um único segundo é para mim trezentos e vinte e sete anos. Para que uma folha ou uma gota caia no chão são necessários muitos de meus séculos. Qulquer objeto que eu toque sai do ambiente com tempo ordinário por algumas décadas comuns, até que retorne a sua vibração molecular original.

Faço pouco do tempo, mando e desmando em seus conceitos, maltráto-o como a um colchão velho.

E um dia, ele parou!

O tempo parou e eu comemorei aos gritos! Tive um orgasmo, fui vitorioso! Tive a glória!
Pensei em ir contar à Aninha que estava penteando o cabelo há quinze milênios, e foi quando me dei conta do acontecido, minha amada, junto com tudo mais, paralisou-se! A diferença vibracional entre nós era tanta, que meu mais sutíl contato a mataria. Eu estava muito velho, mais já havia vivido centenas de milênios, as enfermidades nunca vieram, certamente jamais morreria. O tédio era longo. Nunca ninguém saberia da minha proeza. O tempo estava morto. Voltar ao passado era impossível, ele estava mais que perfeito: Aquele tolo jovem que eu fora, adolescente estúpido que imaginara ser Deus, sentira o gosto do poder, não podêra nega-lo. Percebera tardiamente que passara a nossa vida preso e decidira o suicídio à tortura. Antes, porem escrevera estas palavras em um bilhete memorável que Aninha, aos setenta e dois anos de idade encontrara dentro de uma garrafa amarrada a um esqueleto que aparecera misteriosamente em seu porão:

"Trocaria minha eternidade por um instante ao teu lado,
e no entanto,
tudo o que fiz foi disso o contrário.
És a única parte minha que ainda vive!
Se tens um segundo, use-o com sabedoria, pois nele cabem séculos.
O passado só existe em ti,
o futuro é uma miragem,
é no presente que tudo acontece.
E o tempo, sei agora, nada importa.
Pois como os nossos corpos, facilmente morre."




13 de Abril de 2003